Magistrado de Juizado Especial determinou redistribuição da denúncia.
Na Terça-feira (200929), em Brasília-DF, foi sancionada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, a Lei Federal 14.064/2020, que ficou conhecida como Lei Sansão por estar associada aos atos de crueldade praticados por um homem contra um cão da raça pitbull.
O cachorro, que teve as pernas traseiras decepadas, após ter sido amordaçado com arame farpado no focinho, é conhecido como Sansão, em Confins-MG, cidade localizada na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
O caso é emblemático. As investigações sobre a mutilação do cachorro Sansão revelaram que também o pai do pitbull, o cão Zeus, foi maltratado por Júlio César Santos de Souza em Julho de 2018, e, em razão dos ferimentos, precisou ser sacrificado. Além disso, o agente teria cometido maus tratos contra outros 12 animais, em 12 de Julho deste ano.
As agressões, conforme apurado, foram contra três cães, três gatos e seis galináceos.
Uma ave morreu.
O Ministério Público estadual ofereceu denúncia contra o agressor na Comarca de Pedro Leopoldo-MG e solicitou o julgamento pela Justiça Comum, e não pelo Juizado Especial Criminal, como poderia acontecer em razão da natureza das infrações cometidas.
Os promotores destacaram que Júlio César Santos não preenche os requisitos para a realização do acordo de não-persecução penal, como também não atende aos critérios do art. 89 da Lei n. 9.099/95 (Lei dos Juizados Especiais), não fazendo jus à suspensão condicional da pena, dada, especialmente, a gravidade em concreto dos crimes e a crueldade com que foram praticados.
Decisão
O juiz Leonardo Guimarães Moreira, que atua nos Juizados Especiais da Comarca de Pedro Leopoldo, determinou a remessa dos autos para livre distribuição junto às varas criminais da comarca de Pedro Leopoldo.
O magistrado registrou, em sua decisão, que o presidente da República, motivado pelo clamor público, sancionou a Lei 14.064/2020 que aumenta a pena para quem maltrata cães e gatos, passando a reprimenda para crime de reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição de possuir a guarda de animal.
A mutilação das patas do cão Sansão causou grande revolta e repercussão social e mobilizou vários setores da sociedade voltadas para a proteção dos animais.
"A união de pessoas de todo o País propiciou a doação de uma cadeira de rodas a Sansão, possibilitando que ele voltasse a andar"
Destacou, em sua decisão, o magistrado.
"Todavia, como no Direito Penal a lei não retroage para prejudicar o réu, o autor Júlio César está sujeito às sanções penais previstas na redação original do art. 32 da Lei de Crimes Ambientais"
Argumentou.
"Há forte fundamento para fixar a competência ao Juizado Especial Criminal neste caso na medida em que, mesmo procedendo-se com a soma das penas máximas, os crimes, isoladamente, permanecem como de menor potencial ofensivo.
Ou seja, a aplicação do concurso material, que somente será realizada na sentença, por ocasião da dosimetria da pena, após esgotada a instrução probatória, não altera a natureza jurídica dos crimes em julgamento"
Detalhou o magistrado.
"Porém, esse não é o posicionamento do egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que, em reiterados julgamentos, tem afastado o Enunciado 120 do Fonaje, por não possuir força normativa, e fixada a competência da Justiça Comum quando a soma das penas máximas cominadas aos crimes de menor potencial ofensivo ultrapassa 2 anos"
Registrou o juiz.
Na fundamentação de sua decisão, o magistrado deu ênfase à Declaração de Cambridge de 2012 - um manifesto assinado por 26 neurocientistas que afirmaram não ser mais possível dizer que os animais não são seres sencientes.
"Tal declaração, somada ao princípio da dignidade animal, veio redimensionar o status jurídico dos animais não humanos, de coisas para sujeitos, impondo ao poder público e à coletividade comportamentos que respeitem esse novo status, seja agindo para proteger, seja abstendo-se de maltratar ou praticar contra eles atos de crueldade"
Disse.
De acordo com o juiz, o cão Sansão é um sujeito de direito e, por isso, tem total acesso à Justiça e aos direitos fundamentais.
"Entendo como justa a remessa dos autos à Justiça Comum, não por me desobrigar de julgar tamanha atrocidade, mas seguindo firmemente os mais modernos entendimentos, tenho plena convicção que a Justiça Comum chegará a decisão mais adequada e digna, para um ser que merece nada menos que sua irrestrita dignidade"
Decidiu.
Autos nº 0210.20.000769-3
Com Informações de:
TJMG - CONFINS-MG.
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