O exotismo e a diversidade das frutas do Brasil, um país que aprendeu a se identificar com ilustres estrangeiras como a banana e o coco-da-baia e conhece pouco suas delícias escondidas nas matas e nos campos.
Durante muito tempo, a polpa branca e doce do Bacuri foi um sabor proibido para os índios caxinauás, da Amazônia. Na aldeia, um ser maligno, na forma de cabeça sem corpo, impedia que os nativos provassem o fruto.
Um dia, no entanto, os índios se rebelaram contra a ordem.
"Se ele gosta tanto assim, a fruta deve ser muito boa"
Pensaram.
Resolveram então quebrar o tabu e se banquetear com o quitute, enquanto a figura do mal, aborrecida, subia ao céu para nunca mais voltar: lá, se transformou na Lua.
A ousadia dos caxinauás valeu a pena: ganharam a luz do luar para atenuar a escuridão noturna e descobriram o prazer do sabor de mais um fruto. Um prazer que ficou escondido de boa parte dos brasileiros nos últimos 500 anos.
Como o bacuri, dezenas de frutas se escondem nos meandros de nossas matas e florestas. Algumas se tornaram conhecidas e ganharam o mundo, como a goiaba, o guaraná, o maracujá, o abacaxi, o cacau ou o caju.
Outras, nem tanto.
Buriti, caraguatá, ingá, pequi são apenas alguns dos nomes de doçuras genuinamente brasileiras, que alimentavam lendas e estômagos indígenas desde antes da chegada dos portugueses e permaneceram escondidas pelo manto do regionalismo.
Hoje, boa parte delas já está catalogada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE e convive lado a lado com frutas estrangeiras que, trazidas em sua maioria pelos invasores lusitanos, acabaram se tornando símbolos nacionais.
O Coco-da-baía, por exemplo, só chegou ao Brasil porque algum navegante decidiu tirá-lo de seu ambiente natural, nas ilhas do Oceano Índico.
O mesmo ocorreu com a laranja, o limão e todas as cítricas, que trazem no passaporte o visto de naturalidade asiática, ou a graviola, a acerola e o abacate, originárias da América Central.
E as surpresas não param aí: os fãs de Carmen Miranda podem ficar abismados, mas a banana, que enfeitava seus espalhafatosos chapéus e virou marca registrada da tropicalidade e de muitos regimes políticos, não nasceu no Brasil. Os especialistas acreditam que sua origem seja a Ásia, embora ninguém possa garantir com precisão. O certo é que ela não estava na paisagem quando Cabral aportou por aqui.
Ofuscadas pelo sucesso comercial das frutas trazidas de outros continentes, as brasileiras mantiveram-se sempre em segundo plano. Só não desapareceram por causa de sua íntima ligação com aquilo que, até algum tempo atrás, era uma espécie de terra de ninguém: Florestas tropicais, cerrados e até a caatinga.
"É o chamado endemismo. As frutas que se perpetuaram espontaneamente em um determinado ecossistema"
Explica a pesquisadora Elizabete Lopes, do Instituto de Botânica de São Paulo, que há sete anos se dedica a pesquisar nossas frutas.
Apesar de não serem cultivadas, elas insistem em se reproduzir no Norte, o paraíso das delícias exóticas: a Amazônia é dona do maior índice de endemismo do pais e 68% de sua flora só é encontrada ali.
O curioso desse abandono às frutas nativas é que elas não devem nada em sabor para estrangeiras como a banana a maçã ou a laranja. Ainda na fase de colonização, os bandeirantes paulistas já sabiam disso. Paravam a tropa assim que topavam com um bacuparizeiro, fácil de achar nas margens do Rio Tietê.
Em 1600, o jesuíta e cronista português Simão de Vasconcelos esnobou a corte da metrópole ao escrever:
"O bacupari não perde para nenhuma fruta que exista em Lisboa".
Mais recentemente, já no século XX, o escritor Guimarães Rosa, genial em observar a verdadeira linguagem popular brasileira, soube também descobrir uma delícia nacional a Cabacinha-do-campo, de aparência muito semelhante à da pêra.
Nos relatos de suas andanças pelas veredas do sertão, ele se refere não só ao gosto, mas insinua outras vantagens da frutinha:
"Tomei o refresco de pêra-do-campo (...) e Nhorinha recebeu meu carinho no cetim do pêlo".
Se a Cabacinha-do-campo tem realmente algum poder afrodisíaco, não se sabe. Algumas de nossas frutas são pouco conhecidas pelos botânicos. Entre brasileiras e estrangeiras, existem cerca de 200 identificadas pelo IBGE.
"Mas é provável que esse número seja bem maior, pois nunca foi feito um levantamento abrangente das frutas silvestres"
Adverte a pesquisadora Sílvia Corrêa Chiea, do Instituto de Botânica de São Paulo.
Das catalogadas, algumas ainda não foram analisadas em laboratório para se descobrirem seus nutrientes. Quando isso é feito, boas surpresas saem dos tubos de ensaio. O pequi, semelhante a uma pequena laranja e muito comum no interior de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul, é o campeão em vitamina A entre todas as frutas do mundo.
Embora a maior parte desse tesouro que impressiona os cientistas e encanta o paladar esteja preservada nos campos e matas naturais, seu futuro não está assegurado. A expansão da fronteira agrícola na Amazônia e no Centro Oeste, assim como a destruição da Mata Atlântica no Sudeste, são uma ameaça constante para a existência de muitas espécies.
Algumas já sucumbiram à presença humana, como a jabuticaba-branca. em outros tempos abundante na Mata Atlântica, principalmente junto ao litoral fluminense. Ela seguiu o mesmo destino de seu habitat: a devastação reduziu a mata a menos de 5% de sua área original e hoje pode-se contar nos dedos da mão o número de pés dessa fruta, antes tão comum na região.
Esse tipo de troca da biodiversidade pelas monoculturas foi denunciado recentemente pela Organização para Alimentação e Agricultura - FAO. Segundo a entidade internacional, cerca de 40.000 espécies vegetais podem ser extintas no mundo nos próximos cinqüenta anos, devido à especialização do plantio.
Só se planta aquilo que vende.
Certamente foi isso que fez do maracujá, do caju e de outras brasileiras exceções no quadro do nosso exotismo: são todas daqui. mas, como caíram nas graças dos gulosos, tornaram-se vedetes.
Além de prejudicar a cadeia alimentar, o desaparecimento de frutas tão diferentes significa um desperdício.
"Estaremos perdendo um grande potencial de alimentação"
Diz Dalmo Catauli, pesquisador da Empresa Brasileira de Agropecuária - EMBRAPA.
Mais do que isso, também se perde uma chance de bons negócios. Ao contrário das laranjas brasileiras, que para competir no mercado internacional dependem sempre das geada e nevascas nos pomares americanos, frutas nativas como guaraná, babaçu, maracujá e pequi não têm concorrente em nenhum país.
A primeira pessoa a perceber isso foi Maurício de Nassau, o holandês que governou Pernambuco durante sete anos no século XVII. Ao ver que o caju alimentava os índios, evitava que seus marinheiros contraíssem o escorbuto, doença causada pela carência de vitamina C, e, principalmente, alcançava bons preços na Europa, onde se transformava em saborosos doces, ele não teve dúvidas: baixou uma lei que multava em 100 florins quem abatesse um cajueiro.
Bacuri (Platonia insignis)
Família: Guitiferae (mesma do bacupari).
Nome científico: Platonia insignis Mart.
Origem: Pará, mas é encontrada no Maranhão, Goiás e Mato Grosso
Arvore: Com até 35 metros de altura e copa em forma de cone invertido.
Fruto: Com 250 gramas, é redondo. de polpa branca, doce e suco viscoso.
Frutificação: Dezembro a Maio.
Principais nutrientes: Fósforo, Ferro e Vitamina C.
Caraguatá (Bromélia antiacanta bertol)
Família: Bromeliaceae (mesma do abacaxi).
Nome científico: Bromélia antiacantha Bertol.
Origem: Brasil, Principalmente no Espírito Santo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
Árvore: Herbácea, alcança 2 metros de altura.
Fruto: Ovalado, pequeno, com polpa amarela e ácida.
Frutificação: Janeiro a Julho.
Jabuticaba-branca (Myrciaria aureana)
Família: Myrtaceae (mesma da goiaba).
Nome científico: Myrciaria aureana Mattos.
Origem: Brasil, Principalmente Mata Atlântica.
Árvore: Com até 3 metros, tronco de casca amarelada e ramos cilíndricos.
Fruto: Com 2 centímetros de diâmetro, tem cor-verde-clara e de 1 a 4 sementes.
Frutificação: Janeiro.
Principais nutrientes: Cálcio e Ferro (dados referentes à Jabuticaba comum)
Goiaba (Psidium guajava)
Família: Myrtaceae (mesma da jabuticaba).
Nome científico: Psidium guajava L..
Origem: América tropical.
Árvore: Alcança até 10 metros de altura, com caule tortuoso.
Fruto: Casca fina e papa macia, branca ou vermelha.
Frutificação: Abril a Junho e Novembro a Fevereiro.
Principais nutrientes: Cálcio, Fósforo e Vitamina C.
Guaraná (Paullinia cupana)
Família: Sapindaceae (mesma da pitomba).
Nome científico: Paulinia cupana H.B.K.
Origem: Região Amazônica.
Árvore: Arbusto ou cipó lenhoso, de até 4 metros de altura.
Fruto: Com até 2,5 centímetros de diâmetro, aproveita-se a semente torrada.
Frutificação: Janeiro a Fevereiro.
Caju (Anacardium occidentale)
Família: Anacardiaceae (mesma da manga).
Nome científico: Anacardium occidentale L.
Origem: América Tropical.
Árvore: Com até 20 metros de altura, galhos longos e tortuosos.
Fruto: O fruto propriamente dito é a castanha, enquanto a parte macia e suculenta é, na verdade, o pedúnculo. Um pseudofruto.
Frutificação: Julho a Dezembro.
Principais nutrientes: Caju - Cálcio, Fósforo e Vitamina C.
Castanha-de-cajú - Fósforo, Cálcio e Ferro.
Mandacaru (Cereus jamacaru)
Família: Cactaceae (mesma do cacto).
Nome cientifico: Cereus jamacaru DC.
Origem: Nordeste do Brasil.
Árvore: Cacto agigantado, com até 10 metros de altura e espinhos amarelos.
Fruto: Com cerca de 8 centímetros, casca grossa e vermelha, a polpa é branca e suculenta, com muitas sementes pequenas.
Frutificação: Abril a Maio.
Pinhão (Araucaria angustifolia)
Família: Araucareaceae (tem parentes no Chile e na Austrália).
Nome científico: Araucaria angustifolia (Bert.) O. Kuntze.
Origem: Região Sul do Brasil.
Árvore: Com até 50 metros de altura, ramificada só no alto do tronco.
Fruto: Pinhas que se desfazem, liberando suas sementes, os pinhões.
Frutificação: Abril a Junho.
Principais nutrientes: Proteínas, Cálcio e Ferro.
Sapucaia (Lecuthis pisonis)
Família: Lecythidaceae (mesma da castanha-do-pará).
Nome científico: Lecythis pisonis Camb.
Origem: Natural da Amazônia, pode ser encontrada até o Rio de Janeiro.
Árvore: De até 40 metros de altura.
Fruto: Esférico, de 25 centímetros de diâmetro e até 9 kg de peso, suas paredes grossas têm cerca de 2 centímetros de espessura.
As amêndoas são a parte comestível.
Frutificação: Agosto a Outubro
Ilustres Estrangeiras. Elas enchem as bancas de feira mas, ao contrário do que se pense, não estavam na paisagem quando Cabral chegou.
Pequi (Caryocar brasiliense)
Família: Caryocaraceae (mesma do pequiá).
Nome científico: Caryocar brasiliense Camb.
Origem: Cerrado brasileiro, embora também freqüente em São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.
Árvore: Alcança até 10 metros de altura.
Fruto: Arredondado, casca esverdeada, polpa pastosa e amarela, com sementes espinhosas e comestíveis.
Frutificação: Janeiro a Abril.
Principais nutrientes: É a fruta mais rica em Vitamina A até hoje analisada.
Ingá (Inga cinnamomea)
Família: Leguminosaceae (mesmo do Feijão).
Nome científico: Inga cinnamomea Spruce ex Benth.
Origem: Região Amazônica, junto aos rios.
Árvore: De até 30 metros de altura.
Fruto: Vagem com até 30 centímetros de comprimento e polpa adocicada
Frutificação: Março a Abril.
Principais nutrientes: Cálcio e Ferro.
Cabacinha-do-campo (Eugenia klotzschiana)
Família: Myrtaceae (mesma da goiaba)
Nome científico: Eugenia klotzschiana Berg.
Origem: Brasil, principalmente no sertão de Minas Gerais.
Árvore: Na verdade, dá em pequenos arbustos, com até 1,50 metros.
Fruto: Formato tipo baga, de polpa ácida e com poucas sementes.
Frutificação: Janeiro e Fevereiro.
Pitomba (Talísia esculenta)
Família: Sapindaceae (mesma do guaraná)
Nome científico: Talísia esculenta Radlk.
Origem: Brasil, principalmente Pernambuco.
Árvore: De até 15 metros de altura.
Fruto: Com 3 centímetros de diâmetro, a casca é consistente e a polpa carnosa, branca, de sabor agridoce.
Frutificação: Janeiro e Fevereiro.
Principais nutrientes: Cálcio e Vitaminas A e Vitamina C.
Buriti (Mouritia flexuosa)
Família: Palmae (mesma do coco-da-baía)
Nome científico: Mouritia flexuosa L.
Origem: Região Amazônica.
Árvore: Palmeira de até 25 metros de altura.
Fruto: Ovalado, brilhante, com polpa esponjosa.
Frutificação: Janeiro a Julho.
Principais nutrientes: Proteínas, Cálcio, Fósforo e Ferro.
Bacupari (Rheedia gardneriana)
Família: Guttiferrae (mesma do abricó).
Nome científico: Rheedia gardneriana PI. & Tr..
Origem: Sudeste do Brasil, principalmente na beira de rios.
Árvore: Com até 6 metros de altura e copa piramidal.
Fruto: Alaranjado, de polpa banca e adocicada.
Frutificação: Janeiro a Março.
Babaçu (Orbignya speciosa)
Família: Palmae (mesma do coco-da-baía).
Nome científico: Orbignya speciosa Barb. Rodr..
Origem: Brasil, ocorrendo no Amazonas, Pará, Piauí, Maranhão, Ceará, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais.
Árvore: Palmeira de até 20 metros de altura.
Fruto: Ovalado, casca amarela e verde, polpa oleosa.
Frutificação: Setembro a Dezembro.
Principais nutrientes: Proteínas, Fósforo, Cálcio e Vitamina B1 e Vitamina B2.
Juá (Zizyphus joazeiro)
Família: Rhannaceae (única fruta identificada da família).
Nome científico: Zizyphus joazeiro Mart..
Origem: Regiões áridas do Brasil, do Piauí ao norte de Minas Gerais.
Árvore: Com até 15 metros de altura e copa ampla.
Fruto: Esférico, com a casca fina, carnoso e adocicado.
Frutificação: Janeiro e Maio.
Principais nutrientes: Sais minerais, Vitamina C.
Maracujá (Passiflora edulis)
Família: Passifloraceae (família só de passifloras).
Nome científico: Passiflora edulis Sims.
Origem: Provavelmente Brasil.
Árvore: Trepadeira.
Fruto: Esférico, com até 9 centímetros de diâmetro, a casca dura e a polpa aquosa.
Frutificação: Durante todo o ano, mas escasso de Maio a Agosto.
Principais nutrientes: Cálcio, Ferro e Vitamina C.
Cruá (Sicana odorífera)
Família: Cucurbitaceae (mesma da melancia).
Nome científico: Sicana odorífera L..
Origem: América do Sul tropical.
Árvore: Trepadeira, semelhante ao Maracujá.
Fruto: Formato alongado, de até 60 centímetros de comprimento, com polpa carnosa e amarelada.
Frutificação: O ano todo.
Unaienses
Jisohde - 181223.