"Adolescentes infratores não são bandidos. São cidadãos que precisam de medidas que contribuam para sua reinserção na sociedade"
A experiência da desembargadora Valéria Rodrigues Queiroz à frente da Coordenadoria da Infância e da Juventude - COINJ demonstra a assimilação da mesma proposta.
Por outro lado, de acordo com a magistrada, "o encarceramento em penitenciárias, defendido por muitas pessoas, é solução simplista para um problema tão complexo como a crise do atual modelo de segurança pública em todo o País, e nem de longe se afigura capaz de solucionar a questão".
O consenso é que, em etapa da vida tão desafiadora, essas pessoas, que ainda não estão totalmente preparadas como indivíduos para reagir aos obstáculos, devem receber atenção redobrada, pois podem se envolver com a criminalidade e não encontrar meios para se reerguer.
Reconstrução
O ECA é um marco regulatório dos direitos humanos das crianças e dos adolescentes. Segundo o juiz Afrânio Nardy, responsável, no CIA-BH, por acompanhar o cumprimento de medidas socioeducativas, trata-se de um conjunto de regras que transforma, de fato, o adolescente em sujeito de direitos. Para o magistrado, o estatuto estabelece parâmetros que garantem a dignidade desse público, que assim se torna "partícipe e coautor" do processo de responsabilização.
Um exemplo são as medidas socioeducativas.
De acordo com o juiz Afrânio Nardy, não será possível erradicar a prática infracional a não ser a partir da lógica em que o adolescente se reconhece como alguém que se desviou do esperado, mas é sujeito de direitos.
A coordenadora do CIA, juíza Riza Aparecida Nery, explica que os delitos precisam ser compreendidos num contexto, pois a adolescência é um período de mudanças físicas e emocionais, que significa a perda da condição de criança para a entrada no mundo adulto.
"É uma fase de transição em vários domínios do desenvolvimento biológico, cognitivo e social. Conflitos internos e lutos exigem do adolescente a elaboração e a ressignificação de identidade, imagem corporal, relação com a família e com a sociedade. Neste momento de maior vulnerabilidade, de busca do próprio eu e de aceitação em suas relações sociais, muitos se veem envolvidos em situações de risco".
Segundo a magistrada, o aspecto educacional passou a ter prioridade no tratamento do autor de ato infracional. Hoje, os centros socioeducativos funcionam como escolas, onde os adolescentes frequentam aulas do ensino fundamental e médio e oficinas de capacitação. Eles têm, ainda, apoio médico, psicológico e odontológico.
O juiz Afrânio Nardy observa que, quando os adolescentes se engajam no processo de responsabilização há inúmeras histórias de sucesso.
Direitos e garantias
Ele exemplifica: pelo direito à ampla defesa, há a garantia de ser ouvido e o direito ao silêncio, possibilitando o acompanhamento da instrução processual com colheita de provas.
A juíza Riza Nery ressalta que o trabalho visa à reintegração do indivíduo mas, sem a adoção de políticas públicas, o retorno desse jovem para a sociedade será difícil. Ela argumenta que é necessário que toda a rede envolvida na proteção integral dessa população, que abrange órgãos do Executivo, do Judiciário, o Ministério Público e Prefeituras, entre outros, estarem atuantes para a aplicação adequada do ECA.
Contudo, a superintendente da COINJ, desembargadora Valéria Rodrigues Queiroz, destaca que, para a elaboração de estratégias e políticas públicas, é necessário que se alcance um conhecimento estruturado da realidade sobre o envolvimento desses adolescentes em conflito com a lei. Daí a relevância de pesquisas, relatórios, debates entre os atores que lidam com essas questões, participação da imprensa na conscientização sobre o problema, sem discriminação ou estigmatização.
Estatística
No ano de 2019, foram encaminhados para o CIA-BH, 6.286 casos de apuração de atos infracionais. Desses, 4.022 adolescentes - considerados individualmente - foram encaminhados como autores, em tese, de atos infracionais e 2.264 encaminhamentos dizem respeito à reincidência.
Dos atos infracionais, o tráfico de drogas é o que possui o índice mais alto, seguido pelo uso de drogas e pelo roubo.
Essas infrações somam quase metade do total, ou seja, 48,40%.
No entanto, de 2018 para 2019, houve uma queda de 16,13% na prática de tráfico de drogas e um decréscimo de 6,83% no cometimento de atos infracionais, como um todo.
Conheça os outros atos infracionais mais frequentes, o dia da semana em que costumam ocorrer e o perfil desses jovens quanto a idade, renda familiar e grau de escolaridade, entre outras informações, no Relatório Anual do CIA.
Veja como é o funcionamento do CIA.
Com Informações de:
TJMG - BELO HORIZONTE-MG.
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